A Moda dos Passadiços

COMUNICADO DE IMPRENSA
18/09/2019

A propósito da inauguração de um passadiço no Parque de Serralves, o FAPAS (Fundo para a Protecção dos Animais Selvagens) volta a questionar e criticar a construção de passadiços prejudiciais ao ambiente. A maioria dos passadiços construídos em Portugal podem ser um interessante equipamento de recreio, mas não são um equipamento de conservação da natureza e educação ambiental, nem um bom exemplo de intervenção do território.
Os passadiços sobrelevados ou em estrados de madeira (em inglês, boardwalk, um tipo especial de footpaths) são muito antigos e destinam-se a evitar a degradação do solo e da flora ou/e a vencer obstáculos, como pequenos lagos ou rios.

Na Europa, o primeiro guia para a construção deste tipo de percursos foi editado em 1983 pelo British Trust for Conservation Volunteers; em Portugal o primeiro passadiço instalado de que há registo foi o da Reserva Natural das Dunas de S. Jacinto, na década de 80 do século passado, e destinava-se a permitir o acesso à área de reserva integral, sem pisotear o cordão dunar, e a vencer algumas valas de drenagem.
Em ambiente urbano, os primeiros passadiços terão sido instalados em Vila Nova de Gaia, em 1988, igualmente para defessa das dunas do pisoteio.
A colocação de passadiços, especialmente nas dunas, foi-se alargando ao território nacional e, em alguns casos, assumiu uma função recreativa o que levou a perder-se a noção da sua função inicial e a fomentar a instalação de muito quilómetros de passadiços em que a função lúdica teve prioridade e que, em muitos casos, estão a prejudicar as condições ambientais dos sítios onde foram instalados.

É o caso dos passadiços da Ria de Aveiro, do Alvor, da Reserva Ornitológica do Mindelo, da Barrinha de Esmoriz e de muitos outros, que devassaram áreas naturais até então livres da pressão humana e que, com a facilidade de acesso criada, passaram a ser frequentada por multidões, muitas vezes ruidosas e, frequentemente não apenas em deslocação pedonal, mas também em motociclos.
Mas o culminar foram os, já célebres, passadiços do rio Paiva; para além de perturbarem o corredor ripícola e a sua fauna e flora (que supostamente pretendiam valorizar), não se percebe a necessidade de fazer passadiços onde já havia caminhos. Uma ou outra passagem em passadiço, numa ribeira ou num afloramento rochoso, ainda se compreende, agora 8 km de percurso em passadiço de madeira não faz qualquer sentido.

Acrescente-se que houve recursos financeiros para fazer essa faraónica obra, supostamente para permitir a contemplação do vale do Rio Paiva, mas não houve recursos para intervir na reabilitação do habitat, florestando com espécies adequadas.
E deixemos para outros a análise do risco de os utentes serem surpreendidos por um incêndio, de que já houve dois exemplos e um período de encerramento do passadiço por questões de segurança.
Mas se julgávamos que os passadiços do Paiva tinham sido, nesta matéria, o máximo da má relação com o ambiente, ficamos agora chocados com o novo passadiço entre as árvores do Parque de Serralves que só tem três utilidades: uma é lúdica, outra é perturbar a biodiversidade e outra contribuir para a deseducação ambiental.
Nada temos contra os equipamentos lúdicos, mas em locais apropriados.

Copiar sem adaptar dá, sempre, mau resultado; os canopy walkway ou treetop walkway foram inicialmente construídos (o primeiro foi em 1968, na Malásia) em grandes florestas para permitirem aos cientistas o estudo da vida nas copas das árvores; hoje estão abandonados para esse fim e substituídos por outras formas de acesso (canopy cranes) ao topo das árvores. Dessa função original, foram aproveitados para fins lúdicos e de aventura, que nada tem a ver com o estudo ou a contemplação da natureza, mas sim com atividades de aventura.
Por isso o FAPAS não compreende duas coisas: qual a justificação para perturbar o Parque de Serralves com esta estrutura recreativa e qual a justificação para o pagamento através do Fundo Ambiental cujo objetivo é, naturalmente, promover o ambiente.

Pretende Serralves justificar que este passadiço será mais uma ferramenta do parque para a “sustentabilidade ambiental e proteção da biodiversidade”, o que não se percebe pois é um exemplo de falta de respeito pela natureza e pelo património; quanto à biodiversidade, com exceção da vegetal (que não pode fugir) a outra, a animal, já fugiu há muito, quer das obras quer das luzes, quer das ruidosas noites do “Serralves em Festa” com 264 mil visitantes nos três dias de 2019.
Não se pode ter o melhor de dois mundos: ou “Há vida no parque” ou há festas, iluminação e barulho!

O FAPAS insiste na posição que manifestou em comunicado de 26/11/2018: há que legislar sobre esta matéria, impedindo a proliferação de passadiços que, por agora, vão sendo pagos com fundos públicos; mas como são estruturas em madeira, logo perecíveis em prazo não muito longo, fica a dúvida: de onde virão os fundos para a sua conservação?

Porto, 18 de Setembro de 2019
A Direção Nacional

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