A PROPÓSITO DO ENCERRAMENTO DA REFINARIA DE MATOSINHOS – Porque não restaurar os habitats naturais anteriores?

Comunicado
05/02/2021 – 08h00

Vieram a público notícias, nos últimos dias, sobre o eventual encerramento da refinaria de Matosinhos que, durante mais de meio século laborou a norte de Leça da Palmeira e nos abasteceu de combustíveis e outros produtos. Esperamos que seja acautelado o efeito que isso poderá ter na vida dos trabalhadores e suas famílias, no tecido económico no Norte de Portugal (não apenas em combustíveis, mas outros produtos da GALP e ainda nas receitas do Porto de Leixões), sem esquecer a necessidade de minimizar e compensar passivo ambiental.

A refinaria foi planeada no início da década de 60 do século passado e entrou em operação em 1969, sendo oficialmente inaugurada a 5 de Junho de 1970 (dia que, por irónica coincidência, viria a ser o “Dia Mundial do Ambiente” a partir de 1972).

Foi instalada numa área do litoral anteriormente identificada como de grande valor paisagístico e de biodiversidade, tal como referia o Professor José Malato Beliz em publicação de 1977 (ANEXO).[1]

De resto, sendo o litoral um corredor ecológico fundamental para as migrações, especialmente de aves, as zonas húmidas e agrícolas ao longo da costa assumem uma relevância especial como pontos de apoio, repouso e alimentação (stopovers).

Por isso a importância do território “Um pouco mais para Norte, entre a Boa Nova e a Praia do Paraíso, no Cabo do Mundo, toda a vasta plataforma arenosa que constituía a zona interior da antiga duna, na transição para o tipo de mato a que antes se fez referência [O Cisto-Ulicetum humilis Br-Bl, P. Silva & Rozeira (1964), agrupamento luso-galaico], foi ocupada pela refinaria da Sacor, com a consequente destruição e a poluição hoje bem evidentes.”[2] bem como dos lenteiros (terra húmida, lameiro, charco temporário) do Cabo do Mundo.

Ora se a refinaria vai deixar de operar, os terrenos que ocupa, adquiridos há mais de 60 anos, constituem um ativo mais que amortizado da empresa proprietária, que até é participada pelo Estado Português, pelo que o seu valor é residual nesta operação.

Coloca-se, pois, a definição do destino a dar a estes mais de 200 hectares, após desmontagem da estrutura industrial e descontaminação dos solos.

A Câmara Municipal de Matosinhos já deliberou a constituição de um grupo de trabalho para refletir sobre o que deve ser o futuro dos terrenos ocupados pela refinaria; curiosamente “a autarquia (…) quer “medir” os impactos que o anunciado fecho do complexo petroquímico terá no concelho, nomeadamente em termos económicos e de desemprego, sublinhou.”[3]

Notamos, contudo, que esqueceu os impactos ambientais, positivos, ou negativos, diversos conforme a opção de uso escolhida.

A público já viram duas hipóteses de utilização do espaço: a continuação em atividade industrial (refinaria de lítio, hidrogénio verde…) e uma urbanização.

A primeira iria prolongar os problemas de segurança, poluição e de circulação rodoviária já há muito conhecidos e pouco adequados à situação geográfica; a segunda iria concentrar ainda mais população e atividade humana num litoral já demasiado ocupado e em erosão, quando se pretende exatamente o contrário.

Num tempo em que a União Europeia define na “Estratégia de Biodiversidade da UE para 2030” como meta restaurar habitats naturais o que “Significa também apoiar a recuperação da natureza, limitar a impermeabilização dos solos e a expansão urbana e combater a poluição …”[4] um excelente destino para estes 200 hectares seria a sua reabilitação e transformação numa área protegida, com uma forte componente de laser e educação ambiental.

Desse modo, ir-se-ia também ao encontro da resolução COM (2020) 380, da Comissão Europeia, nomeadamente onde refere que “É imprescindível integrar melhor as questões da biodiversidade na tomada de decisões públicas e empresariais a todos os níveis. Com base nos trabalhos em curso, a Comissão desenvolverá, em 2021, métodos, critérios e normas para descrever as características essenciais da biodiversidade, os seus serviços, valores e utilização sustentável.”

Além do mais, esta seria a solução mais barata e significaria um progresso substancial na renaturalização do litoral e do Corredor Migratório Atlântico, bem como a valorização paisagística e turística da região.

Já não faz sentido, quando há um terreno vago (ou que pode vir a ficar vago) pensar logo em urbanizá-lo, quando mais de metade da população do Mundo já vive em cidades desde 2007 e em Portugal a população diminui.

FAPAS, Quinta de Chão de Carvalhos, 05/02/2021

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INFORMAÇÕES
Nuno Gomes Oliveira
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[1] MALATO BELIZ, J. “NOROESTE”. “Interesse da protecção da Flora e da Vegetação Nalgumas Zonas”. 1977 (datilografado).
[2] MALATO BELIZ, 1977, op. cit, pág. 18.
[3] Cf. Dinheiro Vivo, 03/02/2021
[4] VER: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/HTML/?uri=CELEX:52020DC0380&from=FR

Comunicado em pdf: Comunicado REFINARIA

Anexo: Comunicado REFINARIA - ANEXO

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