EÓLICAS NO NOSSO MAR? PONDERE-SE!
Comunicado
21/02/2023
Foi publicado um pequeno relatório designado “Proposta preliminar das áreas espacializadas e dos pontos para a ligação à Rede Nacional de Transporte de Eletricidade” do “Grupo de Trabalho para o planeamento e operacionalização de centros electroprodutores baseados em fontes renováveis de origem ou localização oceânica”, com assinatura dos ministérios da Economia e Mar, Ambiente e Ação Climática e Infraestruturas e Habitação.
Ficamos a saber pelo Despacho n.º 11404/2022, de 23 de setembro de 2022, assinado pelos já referidos departamentos governamentais, que o grupo de trabalho foi constituído, apenas, por dez representantes de organismos oficiais, esquecendo em absoluto as áreas das pescas e da defesa do ambiente.
Ficamos a saber, pelo relatório, que o grupo de trabalho (em tempo record) propõe que 3.393,44 km2 de espaço marítimo nacional, de Viana do Castelo a Sines, sejam consagrados à instalação de sistemas eólicos de produção de energia elétrica.
Nada nos diz o pequeno relatório sobre a interferência dessas eólicas, se se viessem a instalar, na vida marinha, quer na vida aquática quer nas aves.
Não nos diz o relatório como esses milhares de quilómetros quadrados, que ocupam parcialmente e fragmentam a importante Rota Migratória do Atlântico Ocidental, interferem com inúmeras espécies e dezenas de milhares de indivíduos, de aves marinhas protegidas por lei.
Não dos diz o relatório uma palavra sobre o impacto das eólicas na vida aquática, nomeadamente nos peixes, logo na pesca, logo na economia.
Mas 15 associações de pescadores profissionais, reunidas este mês em Viana do Castelo, disseram-nos “Estamos extremamente preocupados atendendo a que, esta experiência que tivemos em Viana do Castelo [primeiro parque eólico em Portugal, WindFloat, instalado desde 2019]. Cerca de uma milha ao redor não há fauna” (Fonte: JN, 14/02/2023).
O relatório é tão pobre e arrogante que, no capítulo, de meia dúzia de linhas, dedicado à “Conservação da Natureza e Reserva Ecológica Nacional” afirma “…as áreas [de implantação das eólicas] deverão situar-se preferencialmente fora destas servidões.”; deverão, “preferencialmente”, mas se der jeito, as eólicas serão mesmo instaladas em áreas importantes para a conservação da natureza, nomeadamente áreas protegidas por legislação nacional e convenções internacionais.
Veja-se esta passagem “Exceciona-se a área de Sintra/Cascais, que se sobrepõe a uma área protegida (Zona de Proteção Especial do Cabo Raso PTZPE0061), dada a proximidade a zonas urbanas de elevado consumo energético, e, por outro, ao facto de se localizar numa das zonas com maior recurso energético. As áreas de Leixões e da Figueira da Foz são adjacentes ao limite exterior do Sítio de Importância Comunitária Maceda/Praia da Vieira (PTCON0063).”
E no mapa que indica a área de eólicas frente à Ericeira, é dito na legenda “Área a evitar das Berlengas”; a “evitar”, se for necessário dar cabo da maior colónia de Portugal continental de aves marinhas, dá-se cabo, pois teve o azar geográfico de estar na “…proximidade a zonas urbanas de elevado consumo energético” e isso é mais importante que a biodiversidade, a paisagem e o turismo!
Já no capítulo do “Património Cultural” (uma única linha!) é escrita a incrível afirmação: “sempre que possível, foram evitados locais com património cultural subaquático assinalado.”; “sempre que possível”, quando não foi possível, condena-se o património, em nome de mais eletricidade.
Ficamos a saber que poderemos vir a ter, ”a prazo” mais 10 GW de potência e até mais do que isso, pois “… até ao momento, os pedidos de TUPEM [Título de Utilização Privativa do Espaço Marítimo Português], incluindo a demonstração de interesse para o desenvolvimento comercial de parques eólicos offshore, ultrapassam já os 10 GW de potência.” Um sucesso comercial garantido!
O que não nos diz o relatório é se vamos continuar a ter sardinha, carapau, corvina e outros peixes, mamíferos marinhos e aves aquáticas.
Recordamos a Resolução do Parlamento Europeu, de 7 de julho de 2021, sobre o impacto no setor das pescas dos parques eólicos marítimos e de outros sistemas de energias renováveis (2019/2158(INI), que termina com a seguinte recomendação “56. [O Parlamento Europeu] Insta a Comissão e os Estados‑Membros a assegurarem que os planos de ordenamento do espaço marítimo garantam a inclusão equitativa das pescas, a continuação sustentável das suas atividades e reflitam de forma justa os legítimos interesses dos pescadores, dos mariscadores e dos aquicultores;”
A FAPAS – Associação Portuguesa para a Conservação da Biodiversidade exige que este relatório, e a proposta nele contida, seja totalmente revisto e que a instalação de eólicas no oceano seja ponderada, não esquecendo os enormes prejuízos que já causaram no território continental, nomeadamente à biodiversidade e ao património paisagístico de que vivem o turismo e as economias locais.
A FAPAS não é contra as eólicas ou outras formas renováveis de produção de energia, mas é contra a miopia tecnocrática desta proposta!
FAPAS- Associação Portuguesa para a Conservação da Biodiversidade
INFORMAÇÕES:
Nuno Gomes Oliveira
fapas@fapas.pt