O FAPAS manifesta a sua preocupação pelo projeto decreto-lei que fixa o regime jurídico da exploração dos recursos geológicos

COMUNICADO
27/07/2020

MINAS, 0,5% DO PIB – TURISMO 8,7% DO PIB

Já em 21 de Abril de 2019 o FAPAS – Fundo para a Proteção dos Animais Selvagens manifestou a sua enorme perplexidade e preocupação face a uma eventual atribuição de direitos de prospeção e exploração de lítio e outros minerais nas Serras da Peneda e Soajo.

O FAPAS reconhece e louva os esforços feitos pelos Governos de Portugal, pelo menos desde o século XVIII, para encontrar e explorar minérios fundamentais para o desenvolvimento industrial; não estaremos errados ao dizer que nenhum ambientalista, no seu perfeito juízo, aceitaria prescindir do seu telemóvel ou das baterias de lítio da sua máquina fotográfica, pois isso corresponderia a um retrocesso tecnológico, coisa que os ambientalistas não defendem (a questão da mobilidade elétrica será assunto para outros fóruns); mas defendem que se prolongue o tempo de uso desses equipamentos e que, em fim de vida, sejam devidamente reciclados e os seus componentes reaproveitados. E defendem, ainda, que a exploração seja feita de acordo com rigorosas regras de respeito social e ambiental.

De resto, os ambientalistas e os naturalistas sempre tiveram um pensamento muito à frente do seu tempo, pois a observação do território e dos ciclos naturais permitem uma visão prospetiva; estar, hoje, contra o lítio seria não honrar a memória do luso-brasileiro que descobriu esse mineral na Ilha de Utö, na Suécia, em 1800, José Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838) que foi, simultaneamente, um dos primeiros mineralogistas portugueses e o primeiro ambientalista português.

Feita esta “declaração de interesses”, importa analisar o projeto de decreto-lei que “desenvolve as bases do regime jurídico da revelação e do aproveitamento dos recursos geológicos existentes no território nacional, incluindo os localizados no espaço marítimo nacional, estabelecidas pela Lei n.º 54/2015, de 22 de junho”.

O que preocupa o FAPAS neste projeto de decreto-lei:

a) Dar tanta importância e prerrogativas a um setor de atividades – mineração – que representa (Dados de 2015) 0,5% do PIB nacional e em termos de emprego, 10.551 trabalhadores sendo que a maioria está no subsector das águas engarrafadas, que não é propriamente mineração[1];

b) Que à exploração dos recursos geológicos sejam dadas prerrogativas – inclusive de expropriação de terrenos – que não são dadas ao património natural e cultural quando se sabe da necessidade urgente de aquisição ou expropriação de várias áreas de interesse natural;

c) Sabendo-se que a mineração interfere com a paisagem e que esta é a base do turismo, devia-se valorizar mais a atividade turística que representa (Dados de 2019) 8,7% para o PIB nacional e cria 336,8 mil empregos[2];

d) Sendo previsível, por notícias já divulgadas, que muitas das pretendidas atividades mineiras se vão localizar em áreas protegidas e classificadas, estranha-se a ausência de qualquer referência, no projeto de decreto-lei, à Autoridade Nacional de Conservação da Natureza (ICNF – Instituto de Conservação da Natureza e da Biodiversidade) e à obrigatoriedade de emitir parecer, especialmente nas áreas da Rede Natura 2000;

e) Estando o Ministério do Ambiente e, logo, o Governo, a desenvolver o modelo de cogestão das Áreas Protegidas (Decreto-Lei n.º 116/2019), deveria o projeto de decreto-lei prever a emissão de parecer pelas Comissões de Cogestão dos parques e reservas naturais;

f) Lamenta-se que o decreto-lei ignore que “… com base na informação de mercado disponível, as viagens motivadas pelo desejo de fruir, contemplar e interagir com a Natureza têm aumentado na Europa a um ritmo médio anual de cerca de 7% nos últimos anos, e todas as previsões indicam que esta taxa de crescimento manter-se-á e inclusive será incrementada no futuro.”[3]

g) No turismo de natureza assume particular importância o turismo ornitológico, o trekking e a fruição das paisagens naturais. Estima-se que 12 milhões e meio de turistas pratiquem anualmente birdwatching[4]. Segundo a Jacada Travel, o número de viagens que envolvem trekking e caminhadas duplicaram entre 2015 e 2016 e novamente entre 2016 e 2017[5]. De acordo com a Booking.com, o aumento do interesse pelo ecoturismo deve-se em 60% à beleza das paisagens naturais que se encontram durante as viagens[6]. Estas atividades podem ser muito prejudicadas pela mineração, especialmente em tempo de pandemia, onde este tipo de turismo tem ainda maior procura.

Nestes termos e, repete-se, não estando contra o aproveitamento dos recursos geológicos, apenas solicitando mais ponderação, o FAPAS reclama:

a) A inclusão da necessidade de pareceres do ICNF e das Comissões de Cogestão das áreas protegidas sempre que uma pretensão de mineração se localize numa área protegida ou classificada, e numa envolvente a determinar;

b) Que os direitos de expropriação consagrados nos artigos 32º e 57º do projeto de decreto-lei em apreço, sejam igualmente consagrados para os valores naturais e culturais, em diploma autónomo a publicar;

c) Que seja junto um novo anexo ao projeto de decreto-lei com a bibliografia que serviu de suporte às opções agora em vias de serem tomadas;

d) Que o artigo 33º (Comissão de Acompanhamento) seja alterado, obrigando à constituição de uma comissão de acompanhamento para todas as explorações e que a composição dessa seja definida no projeto de decreto-lei sub judice, e não casuisticamente pelo DGEG (Direção Geral de Energia e Geologia);

e) Que a alínea c), do nº 2 do referido artigo 33º passe a ter a seguinte redação: “Um representante de associações de defesa do ambiente inscritas no RNOE (Registo Nacional das Organizações Não Governamentais de Ambiente e Equiparadas), a indicar pela CPADA (Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente).”;

f) Deve-se ter em conta a Carta Europeia para o Ordenamento do Território (Conselho da Europa, 1983), que estabelece que o ordenamento das áreas mineiras pode ser definido como o conjunto de ações das administrações públicas, no âmbito das suas respetivas competências, que têm como finalidade a gestão e promoção do aproveitamento racional dos recursos minerais e outros recursos geológicos, no sentido de alcançar um desenvolvimento económico e social, na sua área de influência geográfica, compatível com outros usos e valores do território sobre o qual assenta a atividade mineira.

Quinta de Chão de Carvalhos, Vila Nova de Gaia, 26/07/2020

A Direção do FAPAS – Fundo para a Proteção dos Animais Selvagens

 Informações:

fapas@fapas.pt

[1] FONTE: Informação estatística, Dezembro de 2015, Direção Geral de Energia e Geologia

[2] FONTE: site Turismo em Portugal, 22.04.2020

[3] FONTE: Estudo realizado por THR (Asesores en Turismo Hotelería y Recreación, S.A.) para o Turismo de Portugal, ip www.thr.es, 2006

[4] FONTE: Sports & Fitness Industry Association (www.sfia.org)

[5] FONTE: The European market potential for nature and ecotourism

https://www.cbi.eu/market-information/tourism/nature-tourism/nature-eco-tourism-europe

[6] FONTE: Idem

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