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Público – Em tempos de quarentena, animais podem invadir as cidades – mas isso não é um problema
Além-fronteiras, os animais saltaram dos parques das cidades para as suas ruas desertas em busca de comida ou simples exploração do espaço. Por cá, o fenómeno ainda é pontual e não deve inspirar cuidados — que as autarquias dizem manter. “Não temos de nos preocupar com eles.”
Esta espécie de “migração” de animais selvagens para as cidades “não é nova”. Ainda há pouco tempo Nuno Oliveira lia relatos de javalis avistados em zonas urbanas de Gaia e da Maia. Há meses, porcos e cabras passeavam também pela zona oriental do Porto. Os motivos são outros agora, mas parecem igualmente inofensivos: com menos alimento dado por humanos, alguns animais vêem-se obrigados a passear pela sua sobrevivência. “Este silêncio geral que reina nas nossas cidades põe os animais mais à vontade. E eles andam em busca de alimento.”
É um efeito secundário do confinamento que o coronavírus impôs e, “pontualmente, pode até ser bom”. Porquê? “Porque não alimentar animais da cidade seria uma vantagem”, aponta o presidente da FAPAS, falando numa espécie de “férias” para os bichos: “Os animais selvagens encontram alimento. Não temos de nos preocupar com eles.”
Autarquias mantêm rotinas
Há dias chegou ao PÚBLICO um relato, revestido de preocupação: pavões, galos e patos estavam a voar para fora da Quinta da Alagoa, em Carcavelos, talvez por falta de alimento. A Câmara de Cascais diz não ter conhecimento deste caso, nem de outros animais a saírem fora do seu espaço nos parques do concelho, e assegura que a alimentação continua a ser providenciada por profissionais da Divisão de Gestão de Estruturas Verdes do município “como habitualmente”.
Também em Lisboa, os animais que habitam nos parques e jardins da capital são normalmente alimentados pelos profissionais do município, diz a autarquia em resposta ao PÚBLICO.
A Norte, no Parque da Cidade, Oriental ou Palácio de Cristal, na cidade do Porto, os colaboradores do município não costumam dar alimento aos animais. E assim continua a acontecer por estes dias. Os patos, gansos, pavões, peixes ou outros animais “sobrevivem pelos próprios meios, encontrando alimento nos recursos naturais existentes”, aponta a autarquia, informando que no Porto há 69 espécies de aves, sete espécies de anfíbios, sete espécies de répteis e seis espécies de pequenos mamíferos, sobretudo pequenos roedores.
No Parque Biológico de Gaia as alterações na rotina de trabalho já têm semanas. As equipas que garantem a alimentação, limpeza, higiene e saúde dos animais foram divididas em dois turnos com rotatividade de cinco dias. O objectivo é garantir o bem-estar dos profissionais, porque deles depende o bem-estar da bicharada. Relatos de animais a saírem dos seus espaços, a autarquia não tem para já.
Observar e descobrir mais
Lisboa e Cascais notam ainda que a alimentação sem critério e desordenada (sobras e restos de alimentos) nos espaços verdes “não é de todo aconselhável”, porque pode ter “um efeito perverso”: desadequada para os animais e factor de aparecimento de pragas.
Nuno Oliveira aponta, a propósito, o que aconteceu há mais de duas décadas: “Temos excesso de gaivotas e pombas nas nossas cidades e isso deve-se a alimentação que lhes damos.” Para esse “problema grave”, os dias de urbes desertas podem também ser medicamento.
Um outro fenómeno poderá também contribuir para os relatos crescentes de gente a avistar animais que antes não via. Nomeadamente no que a aves diz respeito: “As pessoas estão mais disponíveis para observar. Eu tenho visto muitas aves na minha varanda. É natural que se observe mais do que antes.”
A ideia tem paralelo com um outro momento: quando em Portugal aumentou consideravelmente o número de observadores de aves, muitos diagnosticavam um crescimento das espécies no país. Mas Nuno Oliveira tem outra interpretação: “O que aconteceu foi simplesmente haver mais gente a observar e a descobrir. Acontece o mesmo agora.”